Há muito para se dizer sobre missões, mas principalmente há muito o que se fazer sobre missões. Apesar dos mais de dois mil anos de história da igreja, estamos muito distantes de cumprir totalmente a ordem que o nosso Senhor nos deu. Missões deve ser a nossa prática cotidiana e não somente o tema de congressos, cultos, seminários, estudos, etc. Estaremos neste estudo abordando algumas das principais questões que envolvem os sujeitos de missões para cumprir o compromisso missionário a nós outorgado por Jesus.
Missões é, indubitavelmente, um dos assuntos mais emocionantes relacionados com o serviço cristão. Do ponto de vista humano é tão antigo quanto Adão, mas do ponto de vista das Sagradas Escrituras, pode ser vista no próprio Deus; por isso mesmo é um assunto profundo e abrangente. Ao longo dos séculos, o homem se afastou do criador e tem vivido em busca de novas formas de adoração: deuses pagãos têm ocupado o lugar do Criador no coração da humanidade, tornando necessário o reencontro do o homem com Deus e é aí que o trabalho missionário de Deus encontra o seu fundamento.
Nesta disciplina estaremos apresentando os temas de missões de modo geral, deixando os aprofundamentos para outras disciplinas que serão estudadas no decorrer do curso de Missiologia. Queremos nesta breve introdução à Missões estudar alguns dos principais temas sobre as Missões Cristãs e pedimos sua atenção para as definições e explicações referentes a cada termo (Missão, Missiologia, Missio Dei) que aqui é apresentado de forma breve para evitar confusões futuras, trataremos também de referir o objetivo e a motivação da Missão Cristã e outros esclarecimentos necessários para a compreensão deste estudo.
Mas o nosso objetivo principal é que este curso o conduza a duas grandes atitudes: a primeira é a busca por um aprofundamento do estudo de Missões; e a segunda é praticar Missões por toda a sua vida cristã em quaisquer modos possíveis.
O que é Missiologia
“Como, pois, invocarão aquele em quem não creram? e como crerão naquele de quem não ouviram? E como ouvirão se não há quem pregue? E como pregarão se não forem enviados? Como está escrito: Quão formosos os pés dos que anunciam o evangelho de paz; dos que trazem alegres novas de boas coisas”. Rm. 10:14-15
Missiologia originada da união entre “Missio” (latim) e “Logos” (grego) possui várias definições. Uma delas é que missiologia é “a ciência ou estudo de missões” ou a ciência que estuda o campo missionário. Para Orlando Costa missiologia é “a crítica sobre a práxis da missão que interpreta e questiona o passado e o agora da fé, buscando e se projetando para o futuro a fim de corrigir, fortalecer, suster ou totalmente mudar o desempenho missionário da igreja“. Já para Verkuyl: “é o estudo das atividades salvíficas do Pai, Filho e Espírito Santo através do mundo, orientadas para trazer o reino de Deus à existência“. Ela pode ser definida também como o estudo sistemático da atividade evangelizadora da igreja e dos meios para realizá-la. Ou ainda como a ciência que tem por objetivo o estudo da grande comissão dada por Cristo Jesus em sua Igreja. A missiologia dedica-se, principalmente, ao caráter transcultural da tarefa evangelizadora. É o estudo da obra missionária ordenada por Jesus Cristo aos seus discípulos, no sentido nacional e transcultural (Mt. 28:19; Mc. 16: 15; At. 1:8).
Podemos dizer ainda que missiologia é o estudo sistemático do trabalho de evangelização da igreja, e os meios utilizados para realizá-lo. É uma ciência muito jovem ainda, apesar de sua ação prática nos transportar à própria história da criação do homem, entretanto, como ciência sistemática propriamente dita teve o seu início com Gustav Adolf Warneck (1834-1910), que por ser o primeiro a iniciar um estudo sistemático da teologia da missão é considerado o pai da missiologia com sua obra prima Evangelische Missionslehre, dividida em cinco volumes, na qual faz teologia da missão a partir da Bíblia conjugando-a com a praxe e a história da missão e foi o titular da cátedra de missiologia em absoluto.
Podemos ainda dizer que a missiologia estuda os fundamentos bíblicos da missão, o papel da Trindade na missão, a vocação missionária, a história da missão, como, onde, por quem, e os motivos pelos quais ela é realizada, etc.
O estudo de missiologia é importante porque se trata da maior tarefa da igreja – a evangelização dos povos. Nós conhecemos o interesse de Deus que sempre foi e sempre será o alcance de todos os povos, raças, línguas, nações e tribos. O fundamental da missiologia é definir as estratégias e os parâmetros para o cumprimento da grande comissão dada por Jesus, tais como: Quem envia e quem é enviado; quais são os obstáculos das missões; o que eu posso fazer e como posso trabalhar para alcançar os povos não alcançados e a evangelizar todos os povos, de uma maneira geral.
Depois de definirmos os termos e seus significados, precisamos analisar outros pontos de igual importância, quais sejam: Pra quê fazer missões? Onde fazer? Como fazer? Quem deve fazer? Quais os obstáculos das missões na atualidade?
“Se puderes, salva os condenados à morte; ajuda os que são levados para o suplício” Pv. 24:11.
A definição de Missão tem sido assunto bastante discutido no estudo de missiologia, contudo sem chegar a um consenso. Muitas derivações procedentes do verbo grego utilizado no Novo Testamento “Apostolein”, que significa a arte de exercer o apostolado ou o ofício de um apóstolo, tem se formado ao longo do tempo. A mais comum são as palavras MISSIO e MISSIONES. O termo Missio surgiu originalmente no século XVI quando os jesuítas e carmelitas enviaram centenas de missionários ao Novo Mundo. Eles usaram a palavra missão para se referir à propagação da fé cristã entre os povos não cristãos, isto é, para traduzir a necessidade da disseminação da fé entre os povos não católicos. Mas desde meados do século XX, vários significados têm sido atribuídos à expressão “Missão”, algumas no sentido mais amplo, outras no sentido mais restrito.
No sentido mais amplo, Missão é toda atividade realizada pela igreja a serviço do Reino de Deus e em sentido mais restrito, refere-se à atividade missionária, a pregação do evangelho entre povos e culturas entre os quais Ele não é conhecido; ou como define J. H. Bavinack, citado por R.B. Kuiper em Evangelização Teocêntrica: “missões é aquela atividade da igreja, essencialmente nada mais do que a atividade de Cristo, realizada por meio da igreja, pela qual a igreja, neste período intermediário, chama os povos da terra ao arrependimento e à fé em Cristo, de modo que se tornem seus discípulos e, pelo batismo sejam incorporados à comunhão daqueles que esperam a vinda do Reino”; Ou como nos diz Bosh, em seu livro Missão Transformadora – Mudança de Paradigma na Teologia da Missão: “A Missão constitui um ministério multifacetado em termos de testemunho e serviço, justiça, cura, reconciliação, paz, evangelização, comunhão, implantação de igrejas, contextualização, etc. inclusive o intento de arrolar algumas dimensões da missão, porém está repleto de perigo, porque de novo sugere que nos é possível definir o infinito. Quem quer que sejamos espreita-nos a tentação de enclausurar a Missio Dei nos estreitos confins de nossas próprias predileções, voltando, necessariamente à unilateralidade e ao reducionismo”.
Em corroboração com Bosh, Labieno Palmares nos informa ainda que: “fazer missões é procurar estar em sintonia com Deus, empenhando-se ao máximo para ver o que Deus vê, ouvir o que Deus ouve e conhecer como Deus conhece, e não apenas isto, é estar disponível para descer onde Deus quer descer, livrar aqueles que Deus deseja libertar e fazer subir aqueles que Deus deseja levar para a ‘Terra que Mana Leite e Mel’”; Ou ainda como nos diz González: “a missão é a atividade de Deus no mundo. Deus é o protagonista da missão”. Deus age no mundo pela Sua graça, para reconciliar o mundo consigo mesmo (2 Co. 5:17-18).
Derivado do latim missio ou “envio”, mais especificamente da expressão latina missione, do verbo mittere, que significa: ação, tarefa, ordem, mandato, compromisso, incumbência, encargo ou obrigação de enviar. No hebraico, é shlichut (pronuncia-se chilirrut) e significa: obrigação de peso e responsabilidade, Missão trata-se, portanto, de uma incumbência – tarefa – obrigação – encargo – comissão especial – vocação – responsabilidade – ordem dada a alguém. No dicionário aparece como ato de enviar ou ser enviado, encargo, incumbência de um dever, compromisso, ordem. Do grego apostolle, traduzido como “apóstolo” para o português, diz respeito a alguém enviado por ordem de outrem para realizar uma tarefa.
Até o século XVI, o termo missão, foi usado exclusivamente para se referir à doutrina trinitária, isto é, ao papel da trindade na história da redenção. De fato, não se pode pensar em Missão de forma dissociada do trabalho da Trindade Divina, como nos diz Carlos Del Pino: “a missão da igreja não pode ser algo independente de Deus e de Cristo, como se a igreja pudesse realizá-la por si só” (Ef. 2:8, 9; Rm. 10:17). Missão também fala do ato do envio e do ser enviado (Jo. 20:21; Rm. 10:14-15), como nos sugere a definição de Carlos Del Pino: “O conceito de envio está diretamente relacionado com a idéia de ‘movimento em direção a’, e é justamente pensando-se em missão como o movimento de Deus em direção ao mundo, que devemos compreender e mencionar a questão do envio em relação à Igreja em Missão”.
Edison Queiroz define: “Missões é levar a mensagem do Evangelho atravessando uma barreira cultural” ou nas palavras de Thomas Reginald Hoover: “A proclamação das Boas Novas a todos os povos em todas as partes do mundo… esta mensagem é proclamada na língua materna de cada pessoa e dentro da cultura em que ela vive” e René Padilla, que a descreve como: “o cumprimento de um mandato que Cristo deu a seus discípulos e que, antes de tudo, tem a ver com a pregação do evangelho a todas as nações da terra”. E a necessidade da Igreja, como comunidade missionária e portadora da Palavra, atravessar barreiras culturais para cumprir a sua tarefa de levar a Salvação para toda a gente. Já Jim Elliot, mártir entre os Aucas no Equador, acreditava que Missão, como envio de Deus, significa “ejetar, empurrar com força” e costumava dizer que: “Nós não precisamos de uma grande chamada de Deus, mas de um chute no traseiro”.
Russel Shedd corroborando com a Palavra de Deus em Ef. 3:8 e 1:11 acrescenta que: “A missão da Igreja, portanto, é ser e levantar porta-vozes Daquele que nos deu a responsabilidade de convidar os perdidos nas trevas para sua maravilhosa luz”. Desse modo podemos perceber que definir a Missão da igreja não é tarefa fácil, e quanto mais se pesquisa maior é o leque de possibilidades para a sua significação. Ainda assim queremos aqui nos referir a MISSÕES como sendo a incumbência dada por Deus à sua Igreja de anunciar as “BOAS NOTÍCIAS” de salvação através do poder do Espírito Santo e testemunhar o que viram e ouviram sobre Jesus Cristo a todos os povos, tribos, línguas e nações (Jo. 3:16; Lc. 2:10, Mt. 28:18-20; Mc. 16:15; At. 1:8), resgatando as vidas ainda perdidas para a preciosa Luz de Cristo. Como expõe o Pacto de Lausanne: “Deus tem chamado do mundo um povo para si e enviado o seu povo ao mundo, como servos e testemunhas”.
Falando sobre o alcance geográfico e no tempo da obra missionária, René Padilla, corroborando com Mt. 24:14 que registra que o alcance geográfico que a missão deve ter é “todo o mundo” e que o seu alcance no tempo é “então virá o fim”; expressa: “A missão pode ou não envolver o cruzamento de fronteiras geográficas; porém, em qualquer caso, envolve primordialmente o cruzamento da fronteira entre o que é fé e o que não é, seja na terra natal (at home) ou no exterior (no ‘campo missionário’), em função do testemunho acerca de Jesus Cristo como Senhor da vida como um todo e de toda a criação”.